terça-feira, 7 de outubro de 2014

RELEASE: ARTISTAS E PROFESSORES DESTACAM A IMPORTÂNCIA DE BERTOLT BRECHT PARA O TEATRO



Olívia Camboim Romano e Paulo Cunha (Foto: Rodrigo Queiroz)


A grande atração da noite desta segunda-feira (06), no Teatro Martim Gonçalves, foi a exibição do documentário “A Vida de Bertolt Brecht” (2006), do diretor Joachim Lang. Presentes na ocasião estavam a doutoranda em Artes Cênicas, Olívia Camboim Romano, e o diretor de teatro, Paulo Cunha, atualmente em cartaz com a peça “As Confrarias”. Eles foram os convidados desta semana para um bate-papo sobre o poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht.

Esta foi a quinta vez que o Projeto Cine Teatro na Escola realizou o encontro entre professores, artistas, estudantes e amantes das Artes Cênicas. Já foram exibidos os filmes “Mário Gusmão: O anjo negro da Bahia”, junto com o curta metragem ODU (08/09); “Slava’s SnowShow (15/09)”; “A Aventura do Théâtre du Soleil (22/09)"; e “Em Quadro: A História de 4 Negros nas Telas (29/09)”. Na próxima segunda-feira (13) será exibido o documentário “Jogo de Cena”, do diretor Eduardo Coutinho.

Para começar o bate-papo da noite, Olívia Romano revelou que seu interesse por Brecht começou ainda durante sua graduação. Ela até já escreveu um livro referente ao dramaturgo – “Uma Arena no Museu: Reflexões sobre a primeira montagem de Brecht em Santa Catarina”. Olívia disse que uma das coisas que lhe chamaram a atenção em Brecht foi a noção de que não apenas o ator, mas também o espectador precisa ser educado. “Isso me intrigou e descobri que na Argentina tem uma Escola de Espectadores [baseada em Brecht]”, comentou.

Já Paulo Cunha iniciou sua fala elogiando o Projeto: “A iniciativa é ótima, de trazer a linguagem cinematográfica que dialoga com as Artes Cênicas”. Sobre a obra de Brecht, ele acredita que o dramaturgo propõe “pensar o teatro como realmente um ato de intromissão. Um ato de se colocar em diálogo com a comunidade, com a sociedade. Sair do próprio umbigo e abrir nossos olhos para a realidade a nossa volta”, argumenta. “Brecht era contra o exibicionismo do ator que não refletia sobre o contexto e o poder que a arte tem”, acrescenta.

No que se refere a sua experiência com o teatro, Paulo Cunha relata que a partir de Brecht foi possível perceber que em primeiro lugar deve haver uma reflexão ética e não só estética do teatro. “Brecht queria o texto vivo. O teatro é uma troca que se efetiva no palco... A reflexão ética é muito importante para o ator. Isso está presente nas Confrarias, apesar de ser um texto brasileiro [Jorge Andrade]”, explica.

Para o diretor, o teatro de Brecht não faz sentido ao contar uma história por ela mesma, mas todo o sentido é feito no link entre a obra e seu tempo (contato social), sendo que todos aqueles que compõem o corpo criativo tem que ter essa consciência.

Paulo citou ainda o gestus brechtiano como algo essencial para o ator. O gestus, na definição dada pelo diretor, pode ser um ato, um gesto, um objeto, algo que seja típico. “É o que nós reconhecemos dentro da nossa cultura, nossa comunidade que leva o público a reconhecer o seu cotidiano”, esclarece.

O gestus é uma forma de se fazer uma narrativa de modo mais social, tendo como referências grupos sociais para mostrar ou explicar uma situação. “Essa identificação [do gestus] é necessária para depois vir o estranhamento, o que o personagem central, Marta, faz na peça [As Confrarias] ao visitar as confrarias e de repente ela faz as pessoas estranharem seu comportamento, fazendo uma reflexão sobre as nossas contradições”, exemplifica Paulo Cunha.

Ele continua: “Em Stanislavski existe o se mágico. Se eu fosse o personagem o que eu faria? É muito subjetivo. Enquanto que Brecht não queria essa individualidade. O típico é que interessa no teatro brechtiano”.

Ainda em se tratando da relevância do gestus social, Olívia Romano acredita que ele pode ser usado no momento inicial do ensaio, para que o ator possa se aproximar do papel. “Gestus são atitudes de conjunto e não individualizadas”, analisa. “O gestus é sempre um super desafio para o ator, mas está aí também em imagens, no texto”. Ela cita o exemplo, presente no documentário, em que a atriz Helene Weigel tem um grito mudo numa das peças de Brecht. O ato da atriz é fruto, segundo Olivia, da percepção da artista a partir da imagem de um cavalo relinchando observado na pintura “Guernica”, de Pablo Picasso, e de uma foto de uma mãe indiana.

Olivia segue relatando suas experiências a partir da obra do dramaturgo alemão: “Do ponto de vista de Brecht o ator continua sendo o ator durante a interpretação. Ele não se anula. Ele continua colocando sua opinião, não só em relação ao personagem, mas também para o espectador refletir o que está sendo posicionado em cena”.

Em outro momento, a plateia indagou os convidados acerca do espetáculo que mais o marcaram.  Olivia respondeu que um dos espetáculos foi “Cacilda!”, dirigida por José Celso Martinez, entre 1998 e 1999. Já para Paulo Cunha, “Piaf”, de Bibi Ferreira, foi um dos mais marcantes, junto com “Romeu e Julieta”, do Grupo Galpão, apresentado no Teatro Castro Alves.

Numa outra oportunidade, ao ser questionada sobre quais posturas foram adotadas diante da montagem de um texto de Brecht (que pode ser considerado sagrado por pertencer a um autor renomado) Olivia Romano revelou que nunca chegou a encenar um texto do dramaturgo, mas tudo o que leu sobre ele está presente nas suas próprias montagens e na sua trajetória acadêmica e profissional. “O texto dele estava em movimento, sofria interferências dos atores, do público. Não é sagrado e intocável”. Ela citou um exemplo, presente no filme, onde a peça “A Vida de Galileu” sofreu modificações após o lançamento da bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, no período em que a peça foi montada.  Olívia ainda destacou o estranhamento como o ponto principal da obra de Brecht.

Por fim, Paulo Cunha revelou que durante o Curso Livre de Teatro da UFBA tentou montar “Santa Joana dos Matadouros”, mas a montagem não ocorreu porque na época não havia o comprometimento necessário. “Infelizmente, não pude ainda ter um texto do próprio Brecht”, lamenta. Paulo ressaltou a Ética como o principal em Brecht.


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